Como Aprender de Verdade?

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Aprenda a “Aprender de Verdade!”

Você já deve ter se perguntado sobre as maneiras mais efetivas para compreender volumes cada vez maiores de conhecimentos, não se perguntou?

Atualmente um profissional deve dominar quantidades de conhecimento muito maiores do que há 50 anos e, considerando que nosso aparato biológico é idêntico ao de meio século atrás, também é óbvio que os processos de ensino-aprendizagem daquela época são inadequados para os dias de hoje.

Então, como devemos ensinar hoje? E como devemos aprender atualmente para termos os melhores resultados? Foi à procura de respostas a esses questionamentos que conclui um Mestrado em EPT (Educação Profissional e Tecnológica).

Tipos de Conhecimentos para Aprender

Conhecimentos Factuais

Entre outras informações aprendi que os conhecimentos são categorizados em: 1) Factuais 2) Conceituais (Conceitos e Princípios) 3) Procedimentais e 4) Atitudinais. Cada uma dessas categorias exigindo a aplicação de recursos distintos por parte dos alunos. Por exemplo, conhecimentos factuais exigem recursos de memorização, mas mesmo nesse caso a memorização não deve se dar sobre os fatos brutos. Aqui os mnemônicos, muito usados em cursinhos pré-vestibular, têm um importante papel como gatilhos (triggers) para que se chegue à informação completa. (Exs.: 1) Mnemônico dos Nomes dos Planetas; 2) Mnemônico dos Meses do Ano; e 3) Mnemônico da Tabuada do 9). Desta forma, através de informações simplificadas, chegamos a informação completa. É a metáfora de “conectar os pontos” que Steve Jobs usava quando se referia ao conhecimento.

Mnemônico dos Meses do Ano - Aprender

Meses do Ano

Conhecimentos Conceituais

O segundo caso, de conhecimentos conceituais, trata-se de definições de termos, considerando toda a complexidade de inter-relações envolvidas. O importante aqui é que o estudante consiga explicar (descrever) o conceito (ou princípio) com suas próprias palavras. Este tipo de conhecimento é sempre precário (provisório), uma vez que, invariavelmente, há possibilidade de aprofundamento.

O professor Antoni Zabala cita que escolas de referência na Espanha fazem com que os alunos respondam formalmente em um lado da folha e respondam, com suas próprias palavras, do outro lado da folha nas avaliações. Este método serve para verificar se o aluno realmente entendeu o conceito ou apenas memorizou o mesmo. Continue lendo este artigo e você descobrirá a importância de responder “com suas próprias palavras” para construir o “seu conhecimento”.

Conhecimentos Procedimentais

A terceira situação trata-se de conhecimentos procedimentais. Neste tipo de conhecimento vale, mais do que nunca, praticar o conhecimento, ou seja, executar ações. Ainda que todo tipo de conhecimento se beneficie, de alguma forma, da ação por parte do estudante, uma vez que não basta apenas receber passivamente as informações. O aluno deve ter uma postura ativa frente ao conhecimento, em outras palavras, deve ser protagonista no processo de ensino-aprendizagem. No guarda-chuva de conhecimentos procedimentais estão os aprendizados de: idiomas, guiar veículos, praticar esportes, programar computadores, etc.

A regra prática é que se o conhecimento utiliza um verbo de ação efetivo, o estudante (agente da ação) deve obrigatoriamente executar procedimentos. É por conta desta prática necessária que o engenheiro deve “engenheirar”, um advogado deve advogar, um médico deve “medicar”, um professor deve ministrar aulas, etc, para que se sintam plenamente capacitados em suas profissões e assim construam seu know-how personalíssimo.

A última categoria é a atitudinal e nela vêm à tona as preferências volitiva e ética, ou seja, as pré-disposições de vontade e caráter.

Aprenda Sozinho e com os Outros

O ensino tradicional, de meio século atrás, voltava-se mais para a memorização de fatos e conhecimentos em seu formato mais formal possível. E é óbvio que o conhecimento pode ser expresso de maneira categórica, principalmente em artigos científicos. Materiais que serão consultados por pessoas de outras culturas e idiomas.

Já para o uso no dia-a-dia você deve evitar este formato formal do conhecimento, pois ele é muito impessoal, sendo assim, nada identificado com você mesmo.

Gravamos melhor, apreendendo verdadeiramente os conteúdos, quando personalizamos os mesmos. Em certo sentido devemos traduzir o conhecimento formal em conhecimento pessoal, em outras palavras, devemos ensinar a nós mesmos, adotando a postura de autodidata. Devemos traduzir o conhecimento categórico em nosso estilo pessoal único e, assim, definitivamente aprender o quanto quisermos.

Neste processo de autodidatismo você exercitará mais e mais sua criatividade, atributo cada vez mais importante para o sucesso profissional no século XXI.

Há 50 anos a sala de aula repetia o processo fabril de produção em massa. O professor ensinava de maneira impessoal para grande quantidade de alunos. Comparando cada aluno com um padrão fixo. Uma exceção era o professor de educação física, que desde sempre ajustou a barra de salto em altura para a condição particular de cada aluno. Fazia isso porque reconhecia a diferença entre os alunos, seja de altura ou de prática no salto em altura. O importante a destacar é que o professor de educação física personaliza o desafio para cada indivíduo.

Vivenciando o Aprendizado

De qualquer forma, destaco que o professor faz a primeira parte do processo de ensino-aprendizagem. A segunda parte (aprendizagem), que mais interessa ao estudante, deve contar com a participação ativa do educando.

E isso serve para nós, meros mortais, como também para os grandes gênios. Como exemplo posso citar que uma vez li que Einstein refez todas as experiências de física que conseguiu.

Einstein, o magnífico físico, não queria obter as conclusões prontas dos experimentos, ao contrário, ele queria vivenciar os mínimos detalhes e confrontar suas próprias conclusões sobre os fenômenos com o que já era pacífico na comunidade científica. Veja que nesse sentido Einstein estava “construindo” seu próprio conhecimento, o que contribuiu para que ele se tornasse um dos dois maiores físicos da história ao lado de Newton (Einstein foi o maior físico do século 20, certamente).

Falando em Newton, ele lamentava que o cálculo algébrico (simbolismo) se tornou o método padrão para a solução de problemas geométricos, enquanto o próprio Newton recomendava e utilizava intensamente o método geométrico (gráfico). Como exemplo, veja aqui o arquivo PDF de sua principal obra PRINCIPIA (primeira edição americana de 1846). Uma preciosa relíquia deste notável mestre!

Princípios Matemáticos da Filosofia Natural - Aprender

Magnum opus de Newton

Técnicas de Aprendizagem

Você vê eu comentar acerca dessas formidáveis personalidades da ciência (Newton, Einstein) e pode achar tudo isto muito distante de sua realidade, portanto, trarei um exemplo de quando eu tinha 15 anos. Nessa época eu estava fazendo um curso de aprendizagem em tornearia mecânica no SENAI, e na fase teórica de preparação para a prática podíamos realizar os vários módulos de ensino na velocidade que quiséssemos (ou pudéssemos), neste sentido o ensino era bastante individual, dando considerável liberdade para o discente avançar em seu próprio ritmo. O instrutor somente atuava para tirar as dúvidas individuais sobre o conteúdo e para aplicar a prova de avaliação.

Pois bem, eu não sou particularmente rápido, longe disso, mas achava aqueles conteúdos bastante simples, logo, eu avançava rapidamente. A questão é que tinha um outro garoto, bastante humilde, que ia ainda mais rápido que eu. Curioso para entender como ele conseguia este ótimo desempenho eu conversei com ele a respeito, e então o colega confidenciou que aprendia com mais facilidade quando “escrevia de próprio punho” o conteúdo. Às vezes escrevia a informação literalmente, mas em outros momentos registrava o conteúdo com suas próprias palavras. Desde então comecei a usar esta técnica, com ótimos resultados de aprendizagem pessoal.

O Poder dos Mnemônicos

Posteriormente, já com 17 anos, descobri o poder dos mnemônicos como modo de memorizar um grande volume de informações em pouco tempo. Aliás, este é o desafio dos cursinhos pré-vestibular, ou seja, em apenas 10 meses ensinar o conteúdo de muitos anos de Ensino Básico (Fundamental + Médio).

Para criar os mnemônicos vale a utilização de: gráficos; músicas; imagens; etc. De preferência com forte carga emocional, pois assim retemos, muitas vezes de maneira vitalícia, a informação.

Para provar isto considere que até hoje eu lembro da expressão (V + F = A + 2) ensinada pelo professor Maninho. Onde V (Vértices), A (Arestas) e F (Faces) de um poliedro convexo (prisma; pirâmide; cubo; etc) na famosa relação de Euler.

Relação de Euler - Aprender

Relação de Euler

Como o professor conseguiu que jovens, em sua maioria com 17/18 anos, gravassem esta fórmula? Simples! Ele apelou para nossas emoções com a frase “Vamos Fazer Amor a Dois”, apresentada de maneira bem teatral. Pronto! Acredito que isto criou uma marca indelével em nossos cérebros. (e no seu também!)

Particularmente, na época, eu queria ser um engenheiro mecânico com acesso direto ao conhecimento formal, embora reconhecesse a utilidade dos macetes “bobinhos” dos mnemônicos. Hoje penso de forma distinta e você saberá porque a seguir.

Um grande desafio de aprendizado para os brasileiros é dominar o idioma Inglês. Neste sentido, o melhor conselho que recebi foi trazer o inglês para o dia-a-dia, para familiarizar-me com ele em uma base diária, de domingo a domingo. De fato, isto faz toda a diferença, e é muito diferente de encarar aulas de Inglês nas terças e quintas, por exemplo, como tremendos sacrifícios, e passar os outros cinco dias da semana literalmente “fugindo do Inglês”. Para entender mais sobre as rotinas diárias recomendo o livro “O Poder do Hábito” de Charles Duhigg.

Identidade e Aprendizado

Por último, ainda a respeito de idiomas, certa vez li que para aprender um novo idioma chegamos a modificar nossa identidade de um “Eu não consigo entender Inglês” para uma identidade “Eu quero, posso, sei e gosto de falar, escutar, ler e escrever em Inglês”. Esta segunda identidade nos permite ser fluentes no idioma mais rapidamente.

A vivência prática tem revelado para mim essas e outras possibilidades. E me mostrou que a afirmação “Quem ensina aprende!” é uma verdade inconteste. Eu sempre aprendo quando dou aulas (ou palestro) em Universidades, Cursos Técnicos, Empresas e mesmo quando dou aulas particulares para meus filhos. E é fato, visto que o professor tem que estudar em detalhes o conteúdo para que faça o máximo sentido para si, pois somente assim poderá ensinar outras pessoas com autoridade, segurança e efetividade. Em um primeiro momento, portanto, o professor ensina a si mesmo.

Em minha trajetória profissional percebi o valor dos mapas mentais, mapas conceituais, infográficos e outros esquemáticos, na apropriação de conhecimentos, principalmente para pessoas que aprendem preferencialmente pelo canal visual, como eu. Isto ficava evidente nos muitos congressos e treinamentos que eu participei nos Estados Unidos, quando os palestrantes e professores usavam esses recursos visuais para ajudar na comunicação com uma audiência, onde muitas pessoas não tinham o Inglês como língua nativa.

Dicas do Professor Pier para Aprender

Uma última dica que dou para você incrementar a sua efetividade no aprendizado, é estudar escutando música clássica, instrumental ou em um idioma que você desconheça. Sei que funciona na prática e o professor Pier (Pierluigi Piazzi) explica porque no vídeo a seguir:

Aliás, o professor Pier desvenda muito bem essas questões à luz da neurociência.

O que achei mais incrível em suas explicações é a respeito da flexibilidade cerebral (neuroplasticidade). Não só o cérebro constrói novos caminhos neuronais, criando novas redes neurais naturais, como também, através da experimentação, os pesos sinápticos (decisórios) de cada neurônio são modificados para consolidar o aprendizado em tela.

Redes Neurais (Naturais e Artificiais)

O funcionamento do nosso cérebro, segundo a neurociência, é semelhante a maneira que as RNAs (Redes Neurais Artificiais) aprendem. E para conhecer sobre RNAs veja este artigo que escrevi sobre o assunto.

Neurônio Artificial - Múltiplas Camadas

Rede Neural Artificial

Eu gostaria de destacar que a participação ativa dos estudantes para apreender o conhecimento é fundamental. Tanto é verdade que a Finlândia tem superado brutalmente o Brasil nas avaliações internacionais do PISA (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes), e, entre outros motivos, identifica-se que os alunos finlandeses são mais estimulados com PBLs (problem-based learning ou project-based learning), enquanto os alunos brasileiros, em sua maioria, praticam a “decoreba” na véspera das avaliações. Assim, os alunos finlandeses se apropriam dos conhecimentos com ampla autoridade, e os alunos brasileiros “tiram a nota” suficiente para passar de ano e logo esquecem os conteúdos.

Você poderá aprender mais sobre isto com o livro do professor Pier “Aprendendo Inteligência“. Eu tenho certeza que, neste livro, o estilo direto e contundente do professor Pier irá impacta-lo. Este é o primeiro volume de uma série de 4 volumes e posso afirmar, por experiência própria, que todos os quatro são excelentes.

Livros do Professor Pier

Livros do Professor Pier (um deles em PDF)

ZDP (Zona de Desenvolvimento Proximal)

Aqui faço uma ressalva: – Em geral eu concordo com o que o carismático professor Pier defendia, mas uma das coisas que discordo é em relação às críticas às pedagogias baseadas no russo Vygotsky. Entre outras coisas, Vygotsky criou o conceito de ZDP (Zona de Desenvolvimento Proximal) que é igual à ZDPot (Zona de Desenvolvimento Potencial) menos a ZDR (Zona de Desenvolvimento Real), sendo a ZDR o conjunto de atividades que o aluno consegue fazer sozinho e a ZDPot formada pelos exercícios que o aluno consegue fazer com a ajuda do professor ou de colegas mais experientes no tema. Vygotsky sugeria que os professores trabalhassem nas ZDPs dos alunos, pois assim as interações aluno-professor e aluno-alunos contribuiriam para o aprendizado. Já o professor Pier focava no estudo solitário do aluno.

Pela minha experiência de vida posso afirmar duas coisas para você caro leitor(a): Primeira) Tanto a interação com outros quanto o estudo solitário favorecem o aprendizado. Segunda) Eu suspeito que se o italiano professor Pier e o russo Vygotsky se conhecessem seriam bons amigos e aprenderiam muito um com o outro. (é digno de nota que ambos concordavam que “pensamos porque falamos” e não que “falamos porque pensamos”).

Resumo Para Lembrar!

1) Crie seus próprios resumos, esquemas, mnemônicos personalíssimos para ensinar um conteúdo a si mesmo. Veja que engenheiros usam o DCL (Diagrama de Corpo Livre) para estudar uma estrutura antes de colocar o problema para o computador resolver. Designers têm seus momentos de maior criatividade com lápis e papel nas mãos. Fazem isto antes de usar as incríveis ferramentas de CAE e CAD 3D para projetar os produtos.

2) Torne-se um “competente inconsciente” que é o estado no qual você dirige um carro, por exemplo. Você faz isso com extrema destreza e de forma automática (inconsciente).

3) Os conteúdos não são apreendidos apenas com base em seus sentidos denotativos. Os sentidos conotativos dos mesmos devem ser considerados, visto que sua carga emocional facilita o aprendizado.

4) Aproveite a tremenda neuroplasticidade (plasticidade neuronal) de seu cérebro. Todos podem aprender!

5) Tenha uma mente brilhante ativando simultaneamente seu cérebro com estímulos racionais e emocionais.

6)Aula dada… Aula estudada… Hoje!”. Isto respeita o ritmo circadiano, indicado pelo saudoso professor Pier.

Cérebro

“É fazendo que se aprende a fazer aquilo que se deve aprender a fazer.”

Aristóteles

PS: nos comentários logo abaixo você verá o Renê Dettenborn falando a respeito da “Curva do Esquecimento” (SRS – Spaced Repetition System). Faço o convite para que você também comente sobre as técnicas de aprendizado que utiliza. Obrigado!

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